28.3.11

Eleições do Sporting: o meu balanço

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A campanha: superficialidade característica do momento
A História da democracia clubistica, sugere a generalização... Foi assim com o Sporting no final dos anos 80 e com o Benfica, uma década mais tarde. O choque da crise gera muitos candidatos, muita discussão e muita participação. Um sinal de vitalidade? Talvez, mas seguramente não um sinal de lucidez e progressão na vida dos clubes. Não é por acaso que dos dois “sinais de vitalidade” que referi anteriormente, saíram, respectivamente, Jorge Gonçalves e Vale e Azevedo.

5 candidatos, mas uma “oferta” absolutamente superficial e com muito pouca profundidade de propostas e argumentos. Quase chocante, para quem viu alguns debates, a forma como se procurou tanto o “soundbyte”, numa altura que, como todos concordavam, era decisiva para o clube.

O rótulo: “rotura” ou “continuidade”
Grande parte das discussões e argumentos andaram à volta disto: a definição dos rótulos. Todos queriam ser a “rotura”, nenhum a “continuidade”. Uma discussão absolutamente estéril do ponto vista argumentativo, mas que, bem vistas as coisas, poderia fazer toda a diferença no posicionamento dos candidatos na corrida eleitoral. E fez.


Os momentos de crise são os mais intensos do ponto de vista emocional. A emoção sobrepõe-se facilmente à razão e, em democracia, quem conseguir tocar na emoção, estará sempre mais próximo de vencer. Muito mais próximo! “Rotura” era a palavra que mais dominava no sentimento dos sócios, nesta como noutras situações idênticas, e quem ficou com esse rótulo ganhou imenso.

Futebol: “projecto”? Qual “projecto”!
A palavra repetiu-se várias vezes na boca dos diversos candidatos: “projecto”. Salvo melhor definição do termo, porém, não houve nenhum “projecto” nas propostas dos candidatos. Soluções, sim, ensaios, no máximo.

O futebol – particularmente nos países latinos – tem uma particularidade: o peso dos resultados. Os resultados, se não forem continuadamente bons, provocam sucessivas roturas e inversões na orientação de gestão. Ou seja, “projectos” só são possíveis em condições invulgares de sucesso, ou com bases que não estejam alicerçadas nos resultados da 1ª equipa.

Para além da óbvia questão do “tempo” que um “projecto” pressupõe – será sempre mais extenso do que um simples mandato – anunciar treinadores e directores desportivos como base de uma nova idiossincrasia, não é um “projecto”, é um acto de fé.

Finanças: Banca vs. Fundos... é uma opção?!
Se a discussão em torno do futebol foi superficial, o que dizer daquilo que se discutiu sobre o financiamento e sustentabilidade do clube?

Primeiro, choca a divergência de diagnósticos sobre a situação actual. Entre a precisão de uns e a contabilidade aérea de outros, oscilam mais 100 milhões de passivo. O pior, porém, é que este tema pareceu não preocupar muito. Seria mais ou menos o mesmo que as próximas eleições do país fossem discutidas tendo a divida do estado como questão secundária.

Depois, os fundos. Como se o problema do Sporting fosse o investimento nos activos. Não é. O problema dos “grandes” em Portugal são as contas correntes e a incapacidade de ter níveis salariais enquadrados com aquilo que acontece com os principais clubes dos 5 mais importantes campeonatos europeus. Mas discutiu-se fundos como se de feijões mágicos se tratassem. Como se fundos fossem garantia de maior competência ou qualidade. Não são.

Por cima de tudo isto, só faltava o debate Fundos vs. Banca. Como se fosse para algum dos candidatos uma opção a “parceria” com a banca, como se o Sporting ou qualquer outro “grande” português pudesse, de um dia para o outro, ignorar centenas de milhões de divida que tem por pagar. Não é mesma coisa financiar liquidez e investir em activos, mas mesmo que fosse...

Tudo isto é especialmente irresponsável – incrível, mesmo! – numa altura em que países inteiros têm a falência à vista.

O futuro: entre o carisma e as soluções
Todas as candidaturas falaram de “projectos” e prometeram o milagre da multiplicação dos peixes – entenda-se, ser campeão, como se isso fosse fácil de conseguir. Todas. A única coisa que apresentaram, porém, foram soluções. Soluções para isto e soluções para aquilo. Remédios e protagonistas.

Aí, a meu ver, houve uma diferença. Godinho Lopes mostrou-se incomparavelmente mais consistente. Aparentemente mais consciente da situação do clube e com a única equipa que, à partida, tem alguma probabilidade de fazer o futebol melhorar. Não que dê para a tal multiplicação dos peixes, claro. A ironia, porém, vem depois. É que Godinho Lopes, tendo a menos má das soluções, revelou também o pior dos carismas, e a pior das capacidades argumentativas. Por isso foi “espancado” em todos os debates e não se livrou que os outros lhe tivessem colado o indesejado rótulo da “continuidade”, em letras bem gordas, e bem no centro da sua testa, para que não escapasse a ninguém. Mesmo havendo candidatos com uma ligação bem maior ao passado recente e mesmo tendo o anterior rosto da “oposição” na sua lista.

Do outro lado, bem nos antípodas de Godinho, emergiu Bruno de Carvalho. Falou-se do Fundo dos russos e da apresentação de Van Basten, mas a grande vitória de Carvalho foi a sua própria capacidade oratória e a forma como cedo garantiu o rótulo da “rotura”. Isso, só por si, fez com que Carvalho fosse um sério candidato. Mesmo sendo um desconhecido, mesmo não tendo qualquer solução que realisticamente garantisse um aumento de competência para o futebol.

Entre a falta de carisma e a falta de soluções, e com muita polémica à mistura, ganhou a falta de carisma. Não sei quem é Bruno de Carvalho nem o que se poderia revelar depois de “aberto” – alguém sabe?? – mas, sem saber também o que o futuro reserva, diria que o Sporting vive melhor sem o carisma do que com o risco da falta de soluções que se perspectivavam. Porque a História está farta de mostrar que é na sede de “roturas” que se cometem os maiores erros. Se o Sporting deseja tanto uma “rotura”, é bom que prepare melhor esse momento, até porque os tempos não estão para brincadeiras.

Resta falar da hipotética divisão do clube – porque não vou falar de uma polémica que pouco me interessa e muito me escapa. A divisão/união faz-se, como quase tudo no futebol, pelos resultados desportivos. Tal como Bettencourt durou 2 anos com 90%, Godinho pode durar uma eternidade com 35%. “Basta” o mais difícil: ganhar.
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